Sumário
A pandemia do novo coronavírus nos deixa lições de como é importante o isolamento social, o uso de máscara, os cuidados com a higiene pessoal e evitar aglomerações. Sem esses cuidados, a sociedade poderia estar enfrentando um problema muito maior e mais severo do que acompanhamos hoje nos noticiários.
Cenários de catástrofes e mundos pós-apocalípticos estão muito presentes dentro das narrativas de games, muito porque a linguagem dos jogos permite experimentar de forma segura determinadas situações em realidades subjetivas, nos dando a chance de escolher caminhos e brincando com nossa capacidade de inovar e compreender as consequências de nossos atos como aprendizado para possíveis acontecimentos reais.
Dessa forma, escolhemos alguns jogos que abordam o contexto da pandemia e que, além de garantir bons momentos de diversão, podem ajudar a compreender melhor o momento que vivemos, colocando sempre o pensamento em nossa mente para a discussão em sociedade: e se tivesse acontecido?
Jogos, vírus e zumbis
Antes de apresentarmos nossa lista, um breve preâmbulo. Como dissemos anteriormente, realidades de um planeta destruído são muito comuns nos jogos eletrônicos. Mundos devastados e transformados por grandes eventos cataclísmicos, guerras nucleares, conflitos e invasões extraterrestres. Entretanto, em uma grande parte dessas narrativas, o cenário desenhado para aventuras de jogos com taxonomias diversas repousa, essencialmente, nas tramas oriundas de grandes infestações que transformaram os seres humanos em monstros e zumbis.
É notória a referência nos games de zumbis pelos filmes de John Romero, o mestre dos filmes de terror dos anos 80. Games como Zombie Zombie, lançado para o ZX Spectrum em 1984 (considerado o primeiro videogame a apresentar zumbis) e outros títulos inspiradores como Entombed (para o Atari 2600, 1982), The Evil Dead (para o Commodore 64, 1984), Realm of Impossibility (para os computadores Atari, 1983), Ghosts and Goblins (lançado nos arcades, 1985), Zombi (computadores Amstrad, 1986) e Sweet Home (para o Famicom, 1989; um dos primeiros jogos no estilo Survivor Horror) apresentavam zumbis de maneira fantasiosa, pela própria construção monstruosa dos mortos-vivos.
Nos anos 90 jogos como Epidemic (Playstation, 1995) e Gunmetal (PC, 1998) tomam o espaço narrativo de mundos devastados por vírus, gerando assim território criativo para expandir ideias de mundos destruídos por esse mal, enquanto que jogos como Zombie Nation (1990), Alone in the Dark (1992), Doom (1993) e Corpse Killer (1994; um dos primeiros jogos de pistola com Zumbis) se apropriavam apenas da estética dos mortos-vivos inimigos. Mas foi com Resident Evil, em 1996, que encontramos o maior expoente desse tipo de narrativa e o game que selou a taxonomia “Survivor Horror”, misturando justamente os dois elementos narrativos dos games citados anteriormente. A produção de Tokuro Fujiwara inovou, inserindo elementos onde o jogador descobre que uma série de experimentos ilegais que estavam sendo realizados por uma equipe de pesquisa clandestina sob a autoridade e supervisão da empresa biomédica Umbrella Corporation, que criou um vírus que transformou pessoas em zumbis. O sucesso do game lançado pela Capcom rendeu inúmeras continuações e Spin-offs. Por anos outras desenvolvedoras de jogos seguiram a mesma fórmula narrativa, elaborando melhor a questão de experimentos governamentais e a destruição de territórios, construindo cenários ideais para games de tiro em primeira pessoa, sobrevivência e até de estratégia, visto em jogos como Nightmare Creatures, de 1997 e o ótimo Syphon Filter, de 1999.
É o que acontece também em Deus Ex, de 2000. Com as mudanças causadas por uma pandemia letal, conhecida como “Morte Cinzenta”, que assola a população mundial, especialmente nos Estados Unidos, e não tem cura, cria-se o ambiente principal da distopia gerada no game. Situado em 2052, o jogo coloca os jogadores na pele de JC Denton, um agente de uma organização antiterrorista que possui habilidades sobrenaturais graças à nanotecnologia. O jogador deve lutar contra as forças hostis que se voltaram contra sua organização. O enredo de Deus Ex retrata uma sociedade em uma lenta derrocada para o caos. Vemos a divisão entre ricos e pobres, não apenas socialmente, mas fisicamente em algumas cidades.
Ao longo dos anos 2000, podemos destacar os jogos Warcraft III, onde uma nova raça, o Flagelo, entra nos campos de batalha, fruto de uma doença chamada a Praga, que dizimou Lordareon e culminando no exército do Lich King, formando assim um dos arcos mais emblemáticos da franquia de jogos RTS da Blizzard. A Capcom também volta a apostar no tema com Dead Rising (2006), construindo um novo universo pós-apocalíptico mais casual e despretensioso, protagonizado pelo conhecido personagem Frank West e as hordas de zumbis da fictícia cidade de Willamette, Colorado. Destacamos também Left 4 Dead (2008), série de FPS cooperativo de grande sucesso da empresa Valve, que conta com um vírus chamado de “Green Flu”, responsável pela epidemia que começou na Pensilvânia e justifica a existência de zumbis. Por último, Prototype de 2009, onde o jogador, no papel de Alex Mercer, deve impedir um surto chamado “Blacklight”, uma praga que transforma os indivíduos em horríveis monstros violentos.
Outros interessantes jogos que se apropriam dessa narrativa e que merecem destaque ao longo dos anos 2010 são, por exemplo, os jogos da desenvolvedora Techland, que se especializou em mundos dentro dessa narrativa, com os jogos da série Dead Island (2011) e Dying Light (2015); ou também Hollow Knight (2017), que de forma inusitada encaixa em seu universo uma doença que dizimou e contaminou os insetos. Outras menções também podem ser citadas, como Bloodborne (2015), onde o jogador, um caçador, tenta descobrir a fonte de uma praga que assola os habitantes da cidade de Yharnam, que é transmitida pelo sangue e desvenda vários mistérios da cidade enquanto luta contra feras e seres cósmicos.
Continuamos a perceber essa capacidade criativa, explorando novas narrativas e contextos, no jogo The Last os Us, Desenvolvido pela Naughty Dog em 2013, que conta a história de um mundo pós-apocalíptico em que um vírus transformou parte da população do planeta em zumbis. Acredita-se que uma criança chamada Ellie seria imune a esse vírus. Então Joel, o personagem principal da trama, é contratado para escoltá-la em segurança. Apesar da trama em um contexto pandêmico, Neil Druckmann, diretor criativa da franquia, afirma construir uma temática com relações paternas e conflitos humanitários dentro do contexto, e é o que vivemos nesta experiência.
A série de video games Tom Clancy tem seu fiel público, e o jogo The Division está geralmente em destaque por seus fãs. O primeiro jogo acontece na cidade de New York. O jogador assume o papel de um agente especial da Strategic Homeland Division. Em um mundo pós-pandêmico, o jogador deve trabalhar para reconstruir suas operações em Manhattan e impedir qualquer atividade criminosa que tenha sido deflagrada na área. Além disso, os jogadores precisarão aprender como a pandemia foi causada.
Apesar de todos esses games se apropriarem da temática de pandemias, tentamos estabelecer em nossa lista final uma construção onde tanto a narrativa como nas mecânicas e dinâmicas dentro do design desses games, priorizassem a pandemia em si, suas consequências e formas de combater e conviver. O resultado são jogos onde a vivência e a experiência da pandemia pudessem trazer maior proximidade para que se possa discutir melhor e compreender nossas atitudes frente ao enfrentamento da Covid-19.
5. Plague Inc.
Muitos dos jogos que citamos neste artigo giram em torno da luta contra um vírus mortal. Em Plague Inc. (2012), os jogadores são na verdade o próprio vírus! Esse é um popular jogo de estratégia em tempo real para iOS que permite aos jogadores criar e nomear uma praga que começará a afetar milhões de pessoas em todo o mundo. O jogo usa um modelo epidêmico com um conjunto complexo e realista de variáveis para simular a propagação e gravidade da praga que chamou até a atenção das autoridades sanitárias mundiais.
A versão atualizada do game para 2020, Plague Inc.: Evolved, é um remake do original, aproveitando-se da propagação do Coronavírus na China em 2020.
4. Bio Inc. Rendemption
Bio Inc. Redemption é um simulador biomédico de 2018 no qual o jogador toma decisões de vida ou morte. É possível criar a doença definitiva para atormentar uma vítima ou jogar como chefe de uma equipe médica que, com sorte, encontrará uma cura para salvar o paciente. O jogo inclui mais de 600 doenças reais, sintomas, testes de diagnóstico, tratamentos e outras condições médicas.
O jogo é a continuação de Bio Inc, simulador mobile de estratégia biomédica no qual o jogador determina o destino final de uma vítima desenvolvendo a doença mais letal possível. Em vez de focar na capacidade de contaminação da doença, o jogo aborda os efeitos que ela causa em um único indivíduo. A versão mobile não tem o modo equipe médica para salvamento. As doenças podem ser atualizadas, aumentando os fatores de risco e retardando a recuperação da vítima antes que uma equipe de médicos altamente motivados encontre uma cura e a salve. Como a sequência de Bio Inc. (que teve mais de 15 milhões de jogadores), Bio Inc. Redemption foi reconstruído do zero para torná-lo o simulador de condição médica mais realista e visualmente deslumbrante disponível.
3.Quarantine
Quarantine é um jogo de 2017 para PC e mostra bem como é difícil combater uma pandemia. É exatamente um jogo que mistura elementos de Plague Inc e XCOM (jogo de estratégia e dominação de território). Porém, o jogo é uma versão bem construída de ambos, com as melhores características de cada um.
O jogo é composto por 3 tipos de doenças, que precisam ser combatidas. Existem quatro classes diferentes e disponíveis, e o jogador escolhe uma delas, o que torna a jogabilidade totalmente diversa e atraente. Existem quatro cidades iniciais diferentes, que parecem ter pouco ou nada a ver com a evolução do jogos.
Ao longo do game o jogador precisa treinar agentes e enviá-los em missões por todo o globo para descobrir mais sobre as doenças e como curá-las. Como dito anteriormente, o jogo tem intensa mecânica de estratégia baseado em turnos. Para conseguir realizar as missões, pode-se atualizar tecnologias e colocar o surto em quarentena antes que destrua toda a humanidade.
2. A Plague Tale: Innocence
Estamos no Século XIV. Em meio à Guerra dos Cem Anos, peste bubônica e perseguições da Inquisição, o continente Europeu viveu uma de suas épocas mais obscuras. É nesse cenário opressor que o game A Plague Tale: Innocense, de 2019, conta uma história muito mais focada nos acontecimentos dessa pandemia. Diferentemente dos games concorrentes, onde provavelmente existe um sistema de armamentos e ação, o jogo foca mais na experiência de sobrevivência na perspectiva do mais fraco. O jogador controla Amicia de Rune, uma jovem de ascendência nobre que vive com a família na Aquitânia. Seu irmão mais novo, Hugo, está doente desde o nascimento; a mãe deles, Beatrice, uma alquimista, o trancou na propriedade da família por anos enquanto tentava inventar uma cura. Com a invasão inglesa, Amicia precisa fugir, e começa uma jornada dura e difícil.
O jogo trabalha o envolvimento pessoal dos irmãos, a crueldade humana e a força da natureza, inteligentemente construída pelos designers através das hordas de ratos da peste negra. Sem dúvida é uma chocante experiência que nos faz refletir sobre como devemos agir enquanto seres humanos em equilíbrio com nós mesmos e com a natureza.
1. Pandemic
O último jogo da nossa lista é talvez o mais interessante título para se jogar. Pandemic não é um video game, e sim um jogo de tabuleiro cooperativo projetado por Matt Leacock em 2008. Se baseia na premissa de que quatro doenças surgiram no mundo, cada uma ameaçando destruir uma região. Pode ser jogado de dois a quatro jogadores, cada um desempenhando uma das sete funções disponíveis: despachante, médico, cientista, pesquisador, especialista em operações, planejador de contingência ou especialista em quarentena. Através do esforço combinado de todos os jogadores, o objetivo é descobrir todas as quatro curas antes que qualquer uma das várias condições de perda de jogo seja alcançada.
Três expansões, Pandemia: On the Brink, Pandemic: In the Lab e Pandemic: State of Emergency, foram lançadas e cada uma adiciona vários novos papéis e eventos especiais, bem como ajustes de regras para adicionar um quinto jogador ou para jogar em equipes. Além disso, várias expansões de regra estão incluídas, conhecidas como “kits de desafio”. Uma versão digital do jogo foi lançada na Steam em 2018.
Pandemic é considerado um dos jogos de maior sucesso no mercado, pois trata de um jogo que pode ser jogado em um tempo limitado (em torno de 60 minutos) por uma gama mais ampla de jogadores e fazendo com que as pessoas não briguem umas contra as outras. O inimigo é o jogo em si, o que talvez represente o espírito que precisamos em todo o mundo: nos unirmos contra a pandemia do novo coronavirus.
Menção especial: jogos independentes
Para terminar essa lista e nosso especial da campanha Museus Pela Vida promovida pela Ibram, temos que destacar o esforço de milhares de desenvolvedores independentes que, sensibilizados com toda essa condição mundial, realizam em suas plataformas online, uma diversidade de propriedades intelectuais com o tema da pandemia. Vejamos por exemplo, a coleção de jogos na plataforma itch.io com temática da pandemia, disponível neste link.
E você, tem algum jogo em especial que te lembrou diretamente de acontecimentos com a pandemia que vivemos hoje? Será que alguma coisa que você fez ou viveu em algum jogo te fez repensar nossas atitudes? Tem algum jogo em especial que podemos destacar? Comente e participe da discussão e vamos mostrar que iniciativas do Museu Bojogá nos atualizam dos fatos e constroem novas perspectivas de futuro com a gamecultura.
Atualiazado em 25/04/2024 por Daniel Gularte
Resident Evil marcou muito e ainda marca, seria o ponto zero dos games atuais!!!! Lembro de vários filmes antigos dos anos 80, mas Resident evil foi o que mais marcou na minha opinião, valeu!!!!