Sumário
Quando a maioria das pessoas pensam em jogos de mão clássicos, seu primeiro pensamento certamente são os produtos da Nintendo, mas enquanto os japoneses fazem praticamente o seu próprio mercado com jogos eletrônicos portáteis, nada do que conhecemos hoje sobre os videogames que cabem no bolso pode ter acontecido se não fosse por uma empresa famosa no mercado americano chamada Milton Bradley, com o seu sistema portátil com cartucho de jogos intercambiáveis: o Microvision, que se tornaria o primeiro console de videogames portátil do planeta.
Histórico
Os videogames domésticos começaram nos Estados Unidos com o Magnavox Odyssey em 1972, depois com a Atari 2600 (1977) e posteriormente o Odyssey² (1978), sendo que todos esses sistemas era necessário um aparelho de televisão para reproduzi-los. As origens dos sistemas portáteis começaram em 1976 com a Mattel lançando seu primeiro jogo eletrônico, uma corrida de carros que poderia ser jogada à mão com um dispositivo de LED (Light Emmiting Diode), seguida com jogos tradicionais como futebol americano, beisebol e outros jogos esportivos, em modelos eletrônicos. Muitas outras empresas fizeram jogos com LED como a Coleco, a Parker Brothers, Entex e Bandai.
De uma forma geral, os jogos eletrônicos portáteis possuem diferenças entre os consoles de videogame portátil. Enquanto que os jogos eletrônicos, também conhecidos como minigames, possuíam apenas um jogo, os consoles portáteis possuem o mesmo comportamento dos videogames de mesa: podem trocar de jogos, já que a unidade de ROM está separada da unidade de processamento. Assim sendo, os jogos eletrônicos embarcados são, em sua maioria, brinquedos eletrônicos com instruções em suas placas que possuem mecânicas de jogos.
Talvez seja isso que fez o Microvision tão diferente: o fato de que o jogador poderia comprar cartuchos para ele em escala infinita. Foi a primeira unidade portátil do mundo a fazer isso. Lançado em outubro de 1979, foi verdadeiramente revolucionário para os jogos de mão existentes na época. Foi também o primeiro sistema portátil que usou uma tela LCD e foi o primeiro sistema a usar um controlador tipo D-Pad (mesmo que ainda de forma rudimentar e não planejada) para o jogo Cosmic Hunter. Enquanto a tela era apenas de blocos de 16 x 16 foi um enorme passo sobre as pequenas linhas vermelhas nos jogos eletrônicos de LED dos concorrentes. Foram produzidos apenas 13 cartuchos para o sistema, desenhado por Jay Smith, que mais tarde passou a ser o grande maestro no desenvolvimento do sistema Vectrex para a empresa GCE em 1981.
Neste mesmo ano, foram produzidos os dois últimos jogos do aparelho, que passou a ser descontinuado, frente aos diversos problemas técnicos que os componentes eletrônicos apresentavam quando o console era exposto a temperaturas mais quentes, ou por um uso mais intenso. O Microvision ainda teve um breve fôlego em 1982 com a tentativa de lançamento de novos jogos exclusivos na Europa, quando foi decidido não mais fabricar nada mais do console, principalmente pelo fato de que não seria possível consertar todas as unidades defeituosas com o tempo, tornando assim um videogame com data de validade de funcionamento. Entretanto a Milton Bradley fez um grande esforço para provar que era possível pensar em videogames portáteis, que inspirou o Game Boy, o Game Gear, e porque não os próprios projetos do Fairchild Channel F e o Atari 2600.
O Console
O console possui um tamanho de 24cm de comprimento, 9cm de largura e 3,5cm de espessura, algo que para a época parecia ser algo pequena, mas impensável nos dias de hoje. Entretanto, a real tela de jogo não tinha mais que 3,5×3,5cm. A unidade em si tem cor escura e comporta o sistema como um todo: unidades de controle e movimentação, sistema de som e a tela. As peças coloridas que envolvem o console por cima são os cartuchos, isto é, o console ficava exposto na troca de jogos.
Os processadores para os cartuchos do Microvision foram feitos com os modelos Intel 8021 (licenciado pela Signetics) e Texas Instruments modelo TMS1100. Isso mesmo: diferente de qualquer sistema hoje comum no mercado, a CPU fazia parte do cartucho. Devido a problemas de compra com a Intel, a Milton Bradley mudou exclusivamente para os processadores TMS1100, incluindo a reprogramação dos jogos que foram originalmente programados para o processador 8021 (que tem plataforma em 8 bits). O TMS1100 era um dispositivo mais primitivo (quase considerado um modelo 4 bits), mas oferecia mais memória e menor consumo de energia do que o 8021. A primeira versão do Microvision precisava de duas baterias devido ao maior consumo de energia, por causo do processador 8021, mas unidades posteriores (projetadas para o TMS1100) tinham apenas um suporte de bateria ativo.
Embora o compartimento da bateria tenha sido projetado para permitir que as duas baterias de 9 volts neste novo modelo sejam inseridas com a polaridade adequada dos terminais positivo e negativo, quando uma bateria era inserida de forma imprópria, enquanto que a outra bateria fosse devidamente inserida, as duas baterias entravam em curto e o sistema superaquecia. A solução foi remover os terminais para uma das baterias para evitar este perigo. Devido ao alto custo de mudança de moldes de produção, a Milton Bradley não eliminou o segundo compartimento de bateria, mas em vez disso removeu seus terminais e chamou o espaço vazio de “bateria sobressalente”.
Ao se plugar um jogo no sistema, o console recebe do usuário os comandos de botões chanfrados no cartucho, cobertos por uma fina membrana. Essa membrana, conectada ao console, emite para o processador do jogo, passando pelo console, os comandos de controle (no total de 12 opções), fechando assim o sistema. O sistema foi lançado na Alemanha com os jogos feitos de botões reais em vez da fina camada de plástico. Esse design era o mesmo das unidades de protótipo originais que foram feitas para os testes em laboratório.
Devido à limitada tecnologia na época as unidades são propensas a uma série de defeitos que podem afetar as unidades ao longo do tempo. O primeiro é grande problema é o denominado “Screen Rot”, onde a má vedação e impurezas introduzidas durante a fabricação do aparelho resultaram na condição conhecida como o que pode-se traduzir por podridão na tela. O cristal líquido espontaneamente gera vazamentos e permanentemente escurece, resultando em uma unidade de jogo que ainda funciona, mas é incapaz de apresentar corretamente a imagem na tela. O calor extremo (como resultado de deixar a unidade ao sol) também pode gerar Screen Rot, podendo destruir instantaneamente a tela, e não há nada que possa ser feito para evitar esse processo. É um defeito comum das telas de LCD rudimentares.
O segundo problema bem conhecido é o dano por ESD (denominação universal para descargas eletrostáticas) onde o microprocessador (que está dentro do topo de cada cartucho) não tem proteção contra ESD e é conectado diretamente aos pinos de cobre que normalmente conectam o cartucho à unidade do Microvision. Se o usuário abrir a porta de proteção que cobre os pinos das conexões, o processador pode ser exposto a qualquer carga elétrica que o usuário tenha acumulado. Se o usuário tiver acumulado uma carga substancial, a descarga pode correr ao redor da borda da porta de contato ou passar direto pela própria porta (ruptura dielétrica). O circuito integrado de baixa tensão dentro do cartucho é extremamente sensível a descargas eletrostáticas, e pode ser destruído por um simples toque, onde o usuário nem percebe essa troca de volts, mas causa um choque fatal para a unidade de jogo, inutilizando o cartucho.
O terceiro problema irá fatalmente acontecer com qualquer unidade do Microvision, não importa o que seja feito: a destruição completa do teclado de controle. Quando se está jogando é necessário pressionar em sobreposições de plástico e eles são facilmente desgastados. Como cada jogo exigia layouts de botões diferentes havia uma espécie de botão “gigante” (sensor geral) dentro da unidade do console e cada sobreposição no cartucho tinha um “botão” fino sobre ele que você pressionaria e a unidade identificaria a área com base em cada jogo. Caso a membrana do cartucho danifique, será impossível jogar novamente.
Jogos
Como visto os jogos do Microvision possuíam os processadores do sistema em seus próprios cartuchos. O jogo que acompanhava o console, Block Buster, é uma versão do famoso Breakout. Na caixa eram anunciados mais outros seis jogos, e a melhor maneira de descreve-los é como jogar variações de breakout. Todos os jogos são limitados à exposição 16 x 16 blocos, e não é muito espaço para variações grandes entre os jogos. Para os padrões de hoje os jogos são muito primitivos, mas em 1979 era muito superior a qualquer brinquedo eletrônico. O que realmente chamou a atenção é a capacidade de jogar jogos diferentes no sistema e considerando que a Milton Bradley foi a única empresa nesse período a desenvolver jogos para o sistema é ruim para o tempo de vida do produto.
O único jogo que foi desenvolvido exclusivamente para o mercado europeu foi Super Blockbuster (1982). O catálogo de natal da loja Montgomery Wards incluiu um anúncio para dois jogos do Microvision: Super Blockbuster e Barrage. Super Blockbuster foi lançado na Alemanha e corresponde a este anúncio. Porém Barrage parece ser um jogo único que não deve ter sido derivado de outro jogo. Até hoje não existem registros deste game, e que se pode afirmar é que o jogo nunca foi lançado, e nem um protótipo foi encontrado.
Lista de jogos por data:
- 1979
- Block Buster
- Bowling
- Connect Four
- Mindbuster
- Pinball
- Star Trek: Phaser Strike (depois chamado apenas de Phaser Strike)
- Vegas Slots
- 1980
- Baseball
- Sea Duel
- 1981
- Alien Raiders
- Cosmic Hunter
- 1982
- Barrage (não lançado – sem protótipo conhecido)
- Super Blockbuster (lançado apenas na Europa)
Mercado
Embora a unidade tenha sido bastante bem sucedida no primeiro ano de lançamento, através de uma boa campanha de marketing, parecia que os consumidores queriam jogos eletrônicos portáteis com variações de jogos na própria unidade, em vez de trocar cartuchos para seus aparelhos. O sucesso momentâneo do portátil Simon (da própria Milton Bradley) e Merlin (da Parker Brother’s) nos EUA e posteriormente no Brasil prova esse ponto, com larga aceitação pelo público. Não existem relatos de empresas que manifestaram interesse de trazer o Microvision para o Brasil, coisa que foi feita com a Estrela com o Genius (Simon americano) e o Merlin.
É improvável que a Milton Bradley tenha produzido milhares de unidades, onde o preço de varejo de US$ 49,99 (US$490 dólares!) era bastante caro na época. Os cartuchos custavam US$19,99 cada. Este é definitivamente um dos sistemas mais obscuros na história dos jogos de vídeo e é muito digno de possuir para o coletor hardcore.
Hoje a grande maioria dos Microvisions não funciona, e os jogos estão defeituosos. Porém é um dos mais cobiçados itens pelos pesquisadores, e é um dever a aquisição deste aparelho para o colecionador de videogame hardcore.
Galeria
Curiosidades
- No filme Sexta-feira 13: parte 2 o Microvision aparece diversas vezes como entretenimento para os jovens personagens da trama
- No primeiro ano de vendas proteções contra descargas eletrostéticas foram posteriormente incorporadas aos jogos e às unidades que começaram a apresentar defeitos
- Ao se trocar um jogo é possível ver a placa de circuitos, que podiam ser das cores vermelho ou verde
Ficha Técnica
Fabricante: Milton Bradley
Ano: 1978
Geração: primeira
CPU: Intel 8021/TI-8 bit – TMS1100-4 bit (no cartucho) a 100 kHz
Resolução: 16 x 16 pixel LCD
RAM: 32 nybbles (16 8-bit bytes, integrada {a CPU)
ROM: 2K
ROM do cartucho: 2K no total (integrada na CPU; cada CPU [e diferente)
Processador de vídeo: Custom (made by Hughes)
Som: beeper Piezo
Entrada: teclado de 12 botões, um paddle
Alimentação: uma bateria de 9 volts (TMS1100), duas baterias de 9 volts (Intel 8021)
Referências
Wikipedia
Giant Bomb
Handheld Museum
Games 101
Atualiazado em 23/04/2020 por Daniel Gularte